Nos arts. 4.º, 5.º, 6.º, 7.º e 8.º do DL 134/2009 são estabelecidos os princípios e as regras jurídicas específicas da actividade dos CTR, sendo possível identificar vários princípios ou deveres gerais e regras jurídicas especiais, passíveis de uma classificação sistemática estruturada em seis grandes áreas:
(i) princípios ou deveres gerais de conduta e ónus da prova;
(ii) regras gerais de funcionamento;
(iii) regras de atendimento e recepção de chamadas;
(iv) regras de menus electrónicos;
(v) regras de emissão de chamadas;
(vi) regras de informação.
O regime sancionatório aplicável está definido no art. 10.º-1, nos termos do qual “constitui contra-ordenação o incumprimento do disposto no artigo 4.º, no n.º 1 do artigo 5.º, nos n.os 1 a 7 do artigo 6.º, nos n.os 1 e 2 do artigo 7.º e nos n.os 3 a 6 do artigo 8.º”1.
Princípios ou deveres gerais de conduta e ónus da prova
Deveres gerais de abstenção do profissional
Nos termos do art. 5.º-2, “no exercício da actividade abrangida pelo presente decreto-lei, o profissional deve abster-se de abusar da confiança, falta de experiência ou de conhecimentos do consumidor ou do utente ou aproveitar-se de qualquer estado de necessidade ou fragilidade em que o mesmo se encontre”.
Este artigo reafirma um conjunto de deveres gerais de abstenção do profissional no âmbito do relacionamento com o consumidor ou utente, deveres esses comuns a qualquer tipo de relacionamento e não sendo específicos dos CTR.
O cumprimento destes deveres é tutelado pelos regimes gerais da responsabilidade civil e da responsabilidade penal, não estando associada qualquer tipo de responsabilidade contra-ordenacional específica ao respectivo incumprimento.
Princípio geral de urbanidade
Nos termos do art. 7.º-3, “caso o consumidor ou o utente expresse a vontade de não prosseguir a chamada, esta deve ser desligada com urbanidade”, consagrando-se, para além da obrigação de desligar a chamada, um princípio ou dever geral de urbanidade do profissional no relacionamento com o consumidor ou utente.
A lei não prevê qualquer tipo de sanção para as situações de incumprimento deste artigo.
Princípios gerais de informação
O art. 8.º estabelece um conjunto de princípios e de regras a que deve obedecer a prestação de informação aos consumidores e utentes.
Nos termos do art. 8.º-1, a “prestação de informação obedece aos princípios da legalidade, boa-fé, transparência, eficiência, eficácia, celeridade e cordialidade”2. Consagrando os princípios gerais a que deve obedecer a prestação de informação nos CTR, este artigo mistura princípios jurídicos gerais típicos, como os princípios da legalidade, boa-fé3 e transparência, com princípios gerais de carácter operacional, como os princípios da eficiência, eficácia e celeridade.
A referência aos princípios gerais da eficiência, eficácia e celeridade, como princípios no âmbito da prestação de informação nos CTR, vem reforçar a legitimidade da sua utilização como critérios de interpretação e de aplicação do Direito do Consumo e, em especial, da sua utilização como critérios de densificação de outros princípios gerais do direito4.
Inversão do ónus da prova
Nos termos do art. 6.º-8, “nos primeiros 90 dias contados da prestação do serviço, o ónus da prova do cumprimento das obrigações previstas no presente artigo cabe ao profissional”.
O ónus da prova5 inverte o regime geral previsto no Código Civil, devendo destacar-se quatro questões fundamentais:
(i) a inversão do ónus da prova é realizada durante o prazo de noventa dias;
(ii) o prazo de noventa dias é contado a partir do início da prestação do serviço de atendimento, devendo considerar-se como tal o momento do atendimento efectivo da chamada pelo sistema de menu electrónico ou o início do período de espera em linha;
(iii) a inversão do ónus da prova aplica-se apenas às obrigações previstas no art. 6.º e
(iv) o prazo de noventa dias para a inversão do ónus da prova estava correlacionado com o prazo de manutenção da gravação das chamadas telefónicas, originalmente previsto no art. 9.º-2 e revogado pelo DL 72-A/20106.
- Cfr. a propósito do regime sancionatório no âmbito do RJCTR, de uma forma desenvolvida, (Melo, 2016g).
- Cfr. a norma do art. 8.º do Decreto 6523/08 (Decreto do Brasil): o “SAC obedecerá aos princípios da dignidade, boa-fé, transparência, eficiência, eficácia, celeridade e cordialidade”.
- Sobre o princípio da boa-fé, cfr. (Dias, 2004) e, a propósito da relação entre boa fé e dignidade da pessoa humana, (Khouri, 2015).
- Como, por ex., para densificação do princípio geral da boa fé, no quadro geral do Direito Civil ou no quadro especial do Direito do Consumo.
- Cfr., a propósito do ónus da prova, (Teixeira & Carvalho, 2013) e (Teixeira, 2015).
- Sobre esta problemática e as dificuldades criadas pela revogação do art. 9º, cfr. (Melo, 2016f).